segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Thin Red Line

Durante muito, mas muito tempo não vou esquecer aquele estrondo. É estranho que aquilo que de mais assustador eu retire de um acidente de viação seja o estrondo. Ou talvez não. Na volta é mesmo assim. Não pensei muito bem ainda nos contornos em volta dele, mas mais no que os meus sentidos captaram naqueles longos segundos sem direcção.

Mas a noite não começou aí...

Acto I

Tal como tantas outras, esta noite começou com trabalho. Muito trabalho. Estamos no dia de Halloween e esta costuma ser uma das noites mais fortes do ano para um bar. Como tal, tudo é preparado muito mais cedo. Há decorações a fazer, trajes a preparar. Este ano, e ao contrário do anterior, não podia caprichar nas vestimentas. O facto de estar a trabalhar está intimamente ligado a isso. De qualquer maneira, mantive o mesmo espírito de anos anteriores e lá me mascarei. Eu nem diria mascarar, antes vestir uma t-shirt que me remetia para um baleado. O meu colega de balcão optou por uns rasgos na camisola à Freddy Krueger. Simples, mas muito eficaz.

Lá para as 2 da manhã, e após centenas de bebidas preparadas, o bar fechou, e aí sim começava a noite para nós. Muita gente teima em comentar as minhas olheiras, reprimindo a minha conduta de pouco dormir. Não querendo explicar detalhadamente, o certo é que ter dois empregos faz-nos desejar ter uns momentos de lazer, nem que seja para desanuviar e estar connosco próprio. Por isso, e após o trabalho, costumo sempre sair. Seja um mero copo, um simples café, ou assistir a um concerto ou DJ set, o certo é que preciso. Pior que o stress físico é o mental inerente a dois empregos e isso é que não deixo acontecer.

E lá fomos nós para o Lux, o único local da noite onde me sinto verdadeiramente bem. Contudo, e antes disso, começam as peripécias da noite. Primeiro a confrontação com um bando de idiotas bêbados que perseguia um pombo aleijado. A culpa aqui é completamente social. Desde cedo que somos desculpados por quase tudo quando bebemos. “Ah, eu estava bêbado por isso é que curti com aquela gaja que não faço ideia quem era”. “Ah, ontem estava mais agressivo e dei chapadas indiscriminadamente porque estava com os copos”. “Pois, nós perseguimos um pombo doente porque tínhamos bebidos demais”. Bando de imbecis é o que chamo a estas pessoas. A única coisa que é verdadeiramente condenada a 100%, pela sociedade é caso se beba e conduza. Nada de errado.

Para tudo o resto, o álcool serve como atenuante. Se querem que vos diga, os gajos que perseguiram o pombo aleijado mereciam partir os cornos numa ravina e cair num buraco cheio de silvas. Que bando de idiotas!!


Acto II


Depois desta situação seguimos para o carro. Aí notamos que a falta de óleo nos travões era por demais evidente. Na saída para o Lux, vindo da Infante Dom Henrique, só conseguimos travar o carro em cima de um passeio. Enfim... adiante... Toca a estacionar.

À porta ouço elogios por causa da minha barba. É definitivo, é quase unânime. Fico melhor com barba...

Já no Lux bebemos mais uns copos, dançamos mais um bocadinho e conversamos bastante. Na hora de ir para casa o Nuno repara que a sua carteira tinha desaparecido. Pelo meio ainda encontro pessoas que se calhar não devia ter visto e que nunca estiveram no Lux nessa noite.

Mais de 40 minutos depois de começar a procurar a carteira, esta lá apareceu. O dono estava em êxtase e chegou mesmo a beijar e lamber a carteira. Hilariante. O certo é que sempre que perdemos a carteira nem pensamos muito no dinheiro que lá tínhamos. O pior são os documentos. Reencontrá-la foi fabuloso. Foi orgásmico.

Entre empurrões e abraços, alcoolicamente alegres, lá seguimos para a nossa roulotte de estimação em busca do Hambúrguer prometido – “The One”. Mas esta já estava fechada. Cabisbaixos lá vamos nós.


Acto III

- Vamos ao Europa, diz o Nuno.
- Deves estar é maluco, digo eu.

Detesto gastar dinheiro estupidamente e sabia que se fosse ao after hours do Europa iria gastar 10 euros por um mau vodka, num mau ambiente ao som de má música. Não gosto de aquilo, ponto final.

Já dentro do carro seguimos para casa. Uns escassos metros após um semáforo, e na nossa faixa, de frente, um taxista distraído, passa um traço continuo e tem uma colisão frontal connosco. O nosso carro perde a direcção, patina um pouco e amocha num sinal de trânsito, bem perto de um candeeiro. A primeira reacção após um acidente destes é um longo suspiro. Também se costuma dizer que foi tudo muito rápido, mas o certo é que aqueles segundos entre o estrondo, o patinar no asfalto e o bater no sinal foram sentidos em câmara lenta.

Lembro-me que pensei em 200 coisas diferentes nesses escassos segundos. Da minha mãe, ao meu boné... tudo veio à minha mente.
E por falar em boné, de uma maneira muito “Signs” – do género, não há coincidências”, finalmente entendi porque o uso constantemente, faça chuva ou sol, calor ou frio. Basicamente foi a pala ultra dura do meu boné de 3 € que me impediu de bater com a cabeça num vidro e ficar ainda mais avariado do que já sou.

Obviamente que nem houve sequer discussão da responsabilidade do acidente, visto que o senhor taxista, idoso e nitidamente com tremores Parkinson, passou um traço contínuo e chocou de frente na nossa faixa.

O certo é que o carro ficou todo espatifado. O capôt descaiu, o para lamas foi parar alguns metros à frente, os espelhos kaput... Em nós nem havia um arranhão, felizmente, e durante a assinatura do acordo amigável ainda houve tempo para comer um croissant que selou uma noite diferente...

Esta porém é claramente a não repetir... Mais valia ter ido para o Europa...

Sem comentários: